De TI a mestre cervejeiro: empresário negro brasileiro transforma paixão em negócio na Finlândia

A chegada de Cleber Goençalvs à Finlândia, em 2007, seria apenas uma visita a um amigo, mas marcou o começo de uma trajetória inesperada, que o levou do setor de tecnologia ao universo das cervejas artesanais. Com uma década de experiência em empresas globais de TI, Cleber decidiu transformar um hobby em uma nova carreira, fundando a cervejaria CoolHead Brew. “Eu fazia cerveja em casa com um amigo, e então resolvi transformar esse passatempo em uma profissão”, relembra Cleber.

Abri a empresa em 2014, mas só consegui vender as primeiras cervejas em 2016. Foi um período de aprendizado intenso: ajustamos o negócio, contratamos um vendedor, erramos e corrigimos a rota. Cada etapa foi uma lição valiosa”, conta.

Cleber também reconhece os desafios enfrentados como empreendedor negro, especialmente em um país estrangeiro: “Assim como em qualquer lugar do mundo, nós negros estamos suscetíveis ao racismo. Já vivi experiências nesse sentido na Finlândia, mas nunca no ambiente de trabalho. A cultura de inclusão aqui é forte, embora existam desafios. Vemos, por exemplo, o que acontece com o Vini Jr. no Real Madrid. Isso só é plenamente compreendido por quem vive essa experiência fora do Brasil”, destaca.

Confira a entrevista completa:

Mundo Negro – O que te motivou a escolher a Finlândia para viver e empreender?

Cleber Gonçalves – Na realidade, eu não planejava viver na Finlândia. Vim visitar um amigo, acabei estendendo minha estadia e consegui um trabalho na área de TI, onde já atuava no Brasil. Aos poucos, fui construindo uma nova vida aqui.

MNComo foi sua experiência profissional na Finlândia antes da mudança de carreira? O que inspirou essa transição?

CG – Trabalhar aqui é bem diferente do Brasil, especialmente no equilíbrio entre trabalho e vida pessoal. A carga horária é mais tranquila, o que me deu mais tempo livre. No início, entrei como principiante, e o trabalho era menos intenso do que eu estava acostumado em São Paulo, onde a rotina pode ser exaustiva. Fui promovido rapidamente, mas depois de um tempo percebi que queria algo diferente. Estava cansado de ficar o dia todo em frente ao computador, sem muita interação. Nessa época, surgiram várias microcervejarias na Finlândia, e resolvi transformar meu hobby em uma profissão. 

Foto: Divulgação

MN – Quais são os principais desafios e oportunidades para profissionais negros que desejam empreender na Finlândia?

CG – O caminho para me estabelecer foi desafiador. Trabalhei com limpeza e em restaurantes enquanto estudava administração de empresas em uma universidade finlandesa. Sabia que isso poderia abrir portas, inclusive se eu decidisse voltar ao Brasil. Enfrentar o racismo também é uma realidade, mesmo em países com boas políticas de inclusão. Mas aqui, especialmente no ambiente de trabalho, vejo um esforço verdadeiro para promover diversidade. Para quem quer empreender, a Finlândia oferece muitas oportunidades de inovação, e o apoio para startups é forte.

MN – Como a diversidade contribui para o setor de cervejas artesanais?

CG – A multiculturalidade agrega muito. Começamos a CoolHead com funcionários finlandeses e logo contratamos um indiano, que trouxe novos conhecimentos para a nossa produção. Eu trouxe sabores e influências do Brasil, e essa mistura de culturas enriqueceu nossos produtos. Hoje temos uma equipe diversa que contribui com ideias únicas, o que faz a CoolHead ser uma cervejaria com identidade multicultural.

MN – Quais são seus planos para o futuro da CoolHead Brew e como pretende incentivar a diversidade?

CG – Quero que a CoolHead continue crescendo de forma sustentável. Nossa meta é expandir a produção para 500 mil litros por ano, mantendo uma equipe diversa, onde todos tenham oportunidades iguais. Pretendo fazer da CoolHead a melhor cervejaria para se trabalhar na Finlândia, com condições de trabalho justas e os melhores salários do setor. Acredito que ter uma equipe diversificada também atrai outros profissionais, inclusive negros, que se identificam com nossa filosofia de inclusão.

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