Texto: Viviane Elias Moreira
O som do silêncio que todos ouvimos, mas que somente alguns se permitem agir. O som do silêncio que vira conivência rotineira, pautada na justificativa dos nossos boletos. No último dia 28 de agosto, mais de 500 pessoas passaram o dia ouvindo as obviedades deste silêncio e seus absurdos, que nos deixaram desconfortáveis, pois a nossa parcela de responsabilidade sobre esse silêncio ficou escancarada. Fayda Belo rompeu a barreira desse silêncio e deixou claro que a nossa responsabilidade diz respeito às suas esposas, mães, filhas, sobrinhas, a você e seus afetos femininos.
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Fayda Belo é o que temos de melhor. Ela é uma mulher preta, retinta, inteligente, de valores inegociáveis em prol do coletivo, o que a transformou em um contraponto de um sistema que não nos informa, mas nos condena o tempo inteiro. Muita gente aprendeu sobre seus direitos com ela, mesmo em uma simples passagem pelas redes sociais. A amplificação de suas ações em transformar o mundo em um lugar mais justo virou um livro que, a partir do Justiça para Todas Summit, faz parte de um ecossistema de provocação para a ação. “De onde você está, que você possa fazer a sua parte para que, um dia, possamos ter de fato espaços, empresas, e nosso país mais justo, mais equânime e que respeite não algumas, mas todas as mulheres.” Essa frase final dela foi o início da nossa obrigatoriedade de agir.
O Justiça para Todas Summit deu um “EITA_ATRÁS_DE_VIXE” necessário para o mundo corporativo: TODOS nós somos parte desse sistema e estamos, mesmo que nos bastidores, perpetuando um ambiente que sufoca e oprime mulheres. Quando foi a última vez que você ouviu, acolheu, respeitou ou ajudou uma mulher em sua empresa, não importa o cargo que ela ocupa?
Com uma abordagem incisiva, inclusiva e relevante, vozes como as de Silvia Nascimento, Aline Midlej, Petria Chaves, Luana Pereira, Lais Franklin, Natália Falcón, Mafoane Odara, Cris Guterres, Semayat Oliveira, Raphaella Martins, Lia Rizzo, Márcia Silveira, Ana Fontes, Helena Berto, Cris Fibe, Renata Ceribelli, Danielle Tores, Cármen Lúcia, Fabiana Correa, Débora Freitas, Sheila de Carvalho, Silvia Chakian, Anne Williams, Luciana Temer, Renata Gil e Luiza Brunet se uniram a Fayda neste evento, além de um grupo de aliados relevantes como Luciano Ramos, Rogério Schietti, Luiz Pacete e Rodrigo Pardal, que não pouparam esforços para expor uma verdade que muitos preferem ignorar: a violência contra a mulher no ambiente corporativo é real e se manifesta de formas que vão além das agressões físicas ou verbais mais evidentes.
Aliás, é importante lembrar que a violência contra a mulher no ambiente de trabalho raramente se revela em gritos e insultos — isso seria até uma demonstração de franqueza por parte do agressor. O problema, como bem elucidado no evento, reside nas microagressões, no gaslighting, na desvalorização sistemática do trabalho feminino e, claro, na perpetuação de um ambiente hostil que mina lentamente a autoestima e a capacidade de contribuição das mulheres. O ápice de tudo isso: os números de casos de violência contra a mulher no ambiente corporativo normalmente são subnotificados, principalmente porque poucas empresas investem em canais com pessoas devidamente qualificadas para identificar e agir rápida e assertivamente. Muitas vezes, esses casos são tratados como meras questões de RH, ou, popularmente, como “casos de desinteligência” conjugal, nos quais a empresa não pode se meter porque acontecem da porta para fora. Só para ficar claro: isso acontece, e muito, da porta da empresa para dentro, e vai muito além do assédio que sua cartilha de boas práticas pode capturar.
Não é surpresa que a diversidade de gênero e a inclusão sejam vistas como fatores de melhoria na performance organizacional. No entanto, quando o ambiente é tóxico para grande parte de suas equipes, o resultado é um retrocesso difícil de mensurar. Ainda mais preocupante é o impacto dessa violência sobre mulheres negras, mulheres trans e mulheres 50+, que, além de enfrentarem os desafios de gênero, lidam com a estrutura silenciosa e massacrante dos rótulos diários de preconceito. A conclusão do evento foi justamente que essa dupla camada de opressão amplifica os efeitos da violência corporativa, tornando-a ainda mais devastadora.
Na música “Dandara”, Emicida traz um lembrete poderoso: “Respeite a luta, respeite o corpo / Minha história não será em vão.” O silêncio também se quebra com música, inclusive os silêncios enganadores. Muito silêncio no mundo corporativo é sinal de alerta, e a maior ironia desse contexto é que, para muitas empresas, a mudança de postura não é apenas uma questão de ética e marketing, mas uma questão de lucratividade.
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