Texto: Patricia Carneiro
No dia de ontem o presidente Lula fez a seguinte declaração ao UOL: “Quero mais mulheres e negros no governo, mas é difícil achar.” E segue: “não é que não tenha (mulheres e negros) . É que a oferta é menor que na medida da população (mulheres e negros) não tiveram uma participação politica histórica mais contundente. Eu quero mais mulheres no governo. Eu preciso de mais negros no governo. Eu preciso de um governo que tenha a cara do Brasil.
Um dia depois ao tomar meu café e estar preparando a entrega de meus trabalhos discentes para a pós-graduação de Inteligência, Estratégia e Inovação da Universidade Federal do Rio Grande do Sul, um colega colunista me manda a matéria do The Guardian, do dia 27.06: “We cannot Deny history again: Brazil floods show how German migration silenced Black and indigentes stories” (Em tradução para o português: “Não podemos negar a história novamente: as enchentes no Brasil mostram como a migração alemã silenciou as histórias de negros e indígenas.”).
Então resolvi parar e escrever esta carta aberta a toda pessoa pública ou da iniciativa privada deste país que sai a público tendo este discurso para dizer: ‘isto é o racismo estrutural na prática e em ação’. Não preciso nem rememorar a fala da presidente do banco roxinho há exatos três anos atrás. Os dados estão aí: retração de programas de inclusão racial, retrocesso, demissão de pessoas qualificadas e ao mesmo tempo este sistema é perverso porque dá palco para alguns continuarem se iludindo e iludindo publicamente sobre o show da diversidade.
Eu não acredito em programas de diversidade e inclusão há muito tempo. Mas fico quieta, não para me eximir, e sim para observar pois sou uma pesquisadora de futuros e narrativas emergentes, e para criar estratégia é preciso muitas vezes colocar a toalha na cabeça e pensar.
Este momento que estamos vivendo de transição nos pede que sejamos mais prudentes nas análises, considerando menos otimismo ou pessimismo, e focando no realismo. O apagamento é sistêmico para produzir a invisibilidade como aponta o artigo do The Guardian. E é verdade sobre sermos minorias em participação politica ou empresarial, temos carregado um legado da escravidão até hoje e uma segregação social silenciosa e contundente.
Mas temos já há muitas gerações profissionais altamente qualificados, mas o sistema escolhe alguns e relega os outros que são bons o suficiente de acordo com a dinâmica deste sistema estrutural brasileiro. E há quem não queira, isto mesmo, não queira participar desta roda viva institucional. Pretos e pretas extremamente qualificados que não querem cargos políticos ou pagar o preço de ser uma liderança em grandes negócios. Não querem por quê? Por que são “burros”? Não são capacitados? Não… porque resolvem que não querem continuar a reforçar esta lógica que não atende a quem deseja um mundo diferente, que deseja mudanças profundas e sistêmicas nestas relações de poder.
Em entrevista à GloboNews, a filósofa, professora e uma das maiores estudiosas sobre direitos das mulheres negras, Angela Davi, diz: “Acho que a política é muito complicada e nem sempre são os líderes políticos que conseguem trazer clareza para a situação ou conseguem imaginar o futuro. Se eu olhar para os EUA, eu não posso apontar para um único presidente que fez algo significativo em termos de transformação do mundo.”
Então acredite, se você liderança pública ou privada não vê o potencial de pessoas negras, ou não consegue acessar as pessoas, é porque está num ponto cego do racismo estrutural. Melhore…
Ps.: Eu fui jovem participante de política estudantil desde os 15 anos assumindo independência quanto a partidos. Observei a forma de tratamento de pessoas pretas na politica institucional e partidária. Escolhi trilhar minha jornada de cidadania ligada a movimentos sociais. E assim como eu muitas pessoas, mulheres negras, em especial se dedicam as suas comunidades gerando impacto e transformação social. Sabe aquela liderança que todo politico quer na sua campanha eleitoral? Pois é… ela tem os skills de liderança que você precisa presidente.