Cleissa Regina Martins estreia como diretora na nova série “Preto Tá Na Moda/Black is Fashionable”. Toda semana, será exibido um episódio no canal Futura, a partir desta terça-feira (4), com um designer de moda negro falando sobre seu trabalho, processo criativo e trajetória navegando a indústria da moda brasileira. Durante a temporada, foram ouvidos estilistas com diferentes características, vindos de diferentes locais do Brasil e do continente africano e com diferentes processos criativos e visões sobre moda.
Ao todo são 8 episódios, sendo exibido um por semana, às 21h, que também serão disponibilizados no Globoplay. Integram o elenco Hisan Silva e Pedro Batalha (Moda pra Todos os Corpos); Jal Vieira (Moda Feita de Gente); Isaac Silva (Moda com Axé); Tenka Dara (Moda que Conecta); Diego Gama (Moda é Forma); Izabella Suzart (Moda nos Pés); Weider Silveiro (Moda é Paixão); e Angela Brito (Moda é Individualidade).
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Ainda em desenvolvimento, o projeto foi apresentado num encontro de cineastas ibero-americanos na Guatemala. Onde, para a roteirista, foi incrível ver o interesse das pessoas de outros países latinos na série, mesmo em países onde a população negra é bem menor do que no Brasil. Cleissa viu de perto pessoas interessadas em conteúdo com diversidade.
“Eu sempre gostei bastante de moda. É uma área na qual é bem difícil para pessoas negras entrarem e se manterem. Então me interessou saber quem está conseguindo furar essa bolha e como estão fazendo isso. A ideia surgiu quando comecei a conhecer alguns designers negros brasileiros que estavam ficando conhecidos na cena e quis muito saber o processo deles, entender como criavam e como tinham chegado ali. Apesar de achar importante falar sobre as dificuldades em entrar nessa estrutura, minha intenção foi ouvir os entrevistados como artistas, entender o que é único nas criações deles. Acho que moda é arte e é política também e busquei na série equilibrar esses dois pontos.”, explica a roteirista.
Cleissa é o nome responsável pela criação e roteirização dos Especiais de Natal “Juntos a Magia Acontece” e “Juntos a Magia Acontece 2”, o primeiro a ter uma família negra como protagonista, e, através desse trabalho, se tornou a primeira roteirista negra a ter um projeto autoral na TV Globo. Atualmente, é colaboradora em Terra e Paixão, novela atual das 21h. Nesta nova série documental, além de roteirista, Cleissa faz estreia também como diretora.
“Eu dirigi e produzi a série, então foi um desafio muito grande, mas também muito gratificante ver o resultado agora. Aprendi muito com esse projeto e acho que pude experimentar algumas coisas que não conseguiria se a série não fosse totalmente autoral. Vemos agora uma pressão por mais profissionais negros no mercado, mas na maioria das vezes para ocuparmos esses espaços não conseguimos arriscar, experimentar, temos que entregar algo num formato já pré-concebido. Acho importante fazer algo diferente, mesmo que seja pra fazer melhor aquilo que é o comum.”, conta.
Trazendo no próprio nome a referência ao tema da moda, a série também se propõe a fazer uma brincadeira com a ideia de que os negros estão em evidência. “Agora todo mundo precisa estar próximo dos temas das negritudes, mas a verdade é que não somos esse bloco homogêneo que tem sido pintado. Apesar dos personagens terem questões similares, são todos muito diferentes. Cada episódio é muito diferente do outro pela singularidade dos entrevistados. Tem personagem que diz que não viveria se a moda acabasse amanhã, tem personagem que diz que acharia ótimo. Não à toa, o título do último episódio diz que moda é individualidade e a personagem traz com força essa ideia de que pessoas negras não são iguais, somos indivíduos”, explica Cleissa.
Com uma equipe majoritariamente negra e jovem e com um bom balanço de gênero, esse também é primeiro projeto de Cleissa realizado pela sua própria produtora, a Gêmeos Filmes, localizada na periferia do Rio, em Magalhães Bastos. Giulia Santos, designer da zona norte do Rio, responsável pela identidade visual da série e Rodrigo Caê, músico e produtor de Belford Roxo, compositor da trilha sonora original, são alguns dos outros jovens negros que compõem a equipe.
Cleissa ganhou o Prêmio Next Generation, do fundo holandês Prince Claus Fund para realização da série. “O financiamento era direcionado a pessoas jovens, mas também fiz questão de trazer jovens negros para a equipe, porque por mais que hoje em dia algumas portas estejam se abrindo, muitas vezes os ambientes de trabalho são bem difíceis, ainda majoritariamente brancos, masculinos e onde a gente não consegue se expressar por completo. Uma das coisas mais legais da produção da série foi que a gente conseguiu criar um ambiente acolhedor, justamente por estarmos numa maioria jovem e negra. Fez diferença também para os personagens, que sabiam que a gente entendia os desafios que eles estavam abordando”, ressalta Cleissa.
Sobre a importância de ter um espaço para não apenas mostrar seu processo de trabalho, Hisan Silva e Pedro Batalha, criadores da reconhecida marca de moda agênero “Dendezeiro”, afirmam que mais que visibilidade, a série abre espaço para refletir as batalhas de ser um negro empreendedor de moda no Brasil fora do eixo Rio-São Paulo.
“Salvador sempre foi visto como um poço criativo, mas o que aconteceu durante muitos anos? As pessoas iam pra Salvador, colhiam tudo que podiam colher, ideias de várias pessoas, e levavam pra outro lugar. Sem a cara e sem a histórias dessas pessoas. Acho que esse é um momento bom em que a gente tem várias marcas avançando porque a gente consegue não só mostrar nossas criações, mas falar sobre o contexto dessas criações, o que aquela peça significa.”, explica Hisan na série.
Angela Brito, estilista nascida em Cabo Verde e vivendo no Brasil, fala na série sobre sua trajetória como mulher negra, sonhos e processo criativo. Sobre a moda e o mercado no Brasil e afora para artistas negros, a artista reflete: “No mercado da moda existe muito uma coisa de considerar o que é cool, bonito, chique e sofisticado. Isso para mim nunca fez sentido. Primeiro porque eu venho de um país africano, sou uma mulher negra, fora do estereótipo do que é considerado chique, legal, inteligente, sofisticado, bonito. Eu sempre estive fora de qualquer um desses padrões, então a indústria nunca me contemplou. Se eu for criar uma moda pensando em tudo isso… eu nem teria criado. Eu tento criar o que eu acredito. Eu acredito que a gente é bonito, que a gente é sofisticado, é chique, é inteligente.”, declara Angela em seu episódio.
De Nova Friburgo, RJ, mas vivendo em SP, o estilista Diego Gama, acredita que no último ano tem-se conseguido quebrar algumas barreiras e chegar mais no mainstream. “Acredito que muito disso vem acontecendo pós-George Floyd. Acho que muito da atenção que as modas pretas vêm recebendo veio depois do meio de 2021, depois que a mídia começou a ser cobrada com mais empenho. Após uma tragédia que fez com que pessoas talvez entendessem uma necessidade de mudança”, expõe.
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