Por Kelly Baptista, diretora executiva da Fundação 1B.
O termo “desigualdade étnico-racial” pode ser definido como a diferença de oportunidades e condições de vida em função da etnia, precisamos colocar essa pauta para entender que em um país de dimensões continentais, o racismo estrutural se expressa em outras dimensões da nossa realidade brasileira, a seguir vamos observar alguns dados que fazem parte do nosso contexto, mas que ainda não abrangem toda a estrutura do racismo que atinge pessoas negras.
Insegurança alimentar
Os dados foram obtidos pelo 2º Inquérito Nacional sobre Insegurança Alimentar no Contexto da Pandemia da Covid-19 no Brasil (VIGISAN), com uma dimensão mais exata da fome no Brasil, que atingiu 33,1 milhões de pessoas em 2022.
Uma em cada cinco famílias chefiadas por pessoas autodeclaradas pretas e pardas no Brasil sofre com a fome (20,6%) – o dobro em comparação aos lares chefiados por pessoas brancas (10,6%). A situação é ainda mais grave quando se leva em conta o gênero: 22% dos lares chefiados por mulheres autodeclaradas pretas e pardas sofrem com a fome, quase o dobro em relação a famílias comandadas por mulheres brancas (13,5%).
O recorte de raça e gênero, também revela que mesmo as mulheres negras com maior escolaridade (8 ou mais anos de estudos), sofrem com a insegurança alimentar moderada ou grave, sendo um terço delas (33%), comparado com 21,3% de homens negros, 17,8% de mulheres brancas e 9,8% de homens brancos.
Falta de acesso a saneamento básico
No ano 2018, verificou-se maior proporção da população preta ou parda residindo em domicílios sem coleta de lixo (12,5%, contra 6,0% da população branca), sem abastecimento de água por rede geral (17,9%, contra 11,5% da população branca), e sem esgotamento sanitário por rede coletora ou pluvial (42,8%, contra 26,5% da população branca), implicando a condição de vulnerabilidade e possibilitando maior desenvolvimento de doenças, segundo (IBGE, 2019).
Internet
Conforme dados da pesquisa TIC Domicílios (2019), quase 30% dos lares brasileiros não possuem acesso à internet, e apenas 39% têm computador. Nas classes sociais D e E, que são justamente as que já sofrem com outros tipos de exclusão social, o percentual de domicílios sem acesso à web é de nada menos do que 50%. No que diz respeito ao uso, 59% dizem não utilizar a internet para estudar e trabalhar. Apenas 31% das pessoas que usam computadores afirmam ter manipulado uma planilha de cálculo, por exemplo.
Para além do ensino de tecnologia, é importante atentar para as desigualdades que cercam os grupos minorizados. Hoje, quando falamos e olhamos para o mercado de maneira geral, o subconsciente projeta um setor intelectualizado, embranquecido e machista, não enxergamos pessoas negras neste lugar exatamente pela falta de diversidade e representatividade. Isso faz com que, por exemplo, os algoritmos permaneçam sendo criados para classificar pessoas negras de forma negativa. As expressões são muitas, como “Cabelo ruim”, “Pessoa feia”, entre outros termos pejorativos.
Moradia adequada
Segundo a pesquisa Educação já da Ong Todos pela Educação, nos dois maiores municípios brasileiros, São Paulo e Rio de Janeiro, a chance de uma pessoa preta ou parda residir em um aglomerado subnormal é mais do que o dobro da verificada entre as pessoas brancas (IBGE, 2019).
“A abolição da escravidão não extinguiu a desigualdade e o preconceito. Ainda hoje, é necessário reconhecer, com tristeza e indignação, que o racismo ainda é forte no Brasil. Silvio de Almeida define o racismo estrutural como um componente orgânico da própria sociedade, refletido na cultura e nas instituições que, sistematicamente, tendem a discriminar grupos racialmente identificados”.