O ator e escritor Lázaro Ramos acaba de lançar o livro “Você Não É Invisível”, sua primeira obra na literatura juvenil, pela Companhia das Letras. A obra fala sobre como os adolescentes, muitas vezes, se sentem sozinhos e confusos. “Eu queria ter escutado que eu não sou invisível. Eu queria ter escutado que eu não preciso ficar sozinho nas minhas angústias”, disse Lázaro em entrevista exclusiva para o Mundo Negro.
O livro tem como protagonistas os irmãos Carlos e Vitória, que moram juntos, mas têm muita dificuldade de se comunicarem e se sentem sozinhos. Lázaro confessa que escreveu várias histórias pessoais na obra. “Vai ser um jogo para as pessoas lerem e tentar adivinhar o que eu experimentei ou não. O livro tem várias pequenas aventuras, várias coisas que são minhas ou histórias que eu ouvi de pessoas que passaram pela minha vida”, brinca.
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Leia a entrevista completa abaixo:
Como foi o processo de criação da sua primeira literatura juvenil?
Esse livro eu comecei escrevendo pra dizer algumas coisas que eu gostaria de ter escutado na minha adolescência. Eu queria ter escutado que eu não sou invisível. Eu queria ter escutado que eu não preciso ficar sozinho nas minhas angústias. Eu queria ter escutado que é importante me comunicar afetuosamente com as pessoas que estão perto de mim porque isso vai me dar força. Eu queria muito encontrar acolhimento também nas minhas dúvidas de adolescente, minhas dúvidas sobre ética, minhas dúvidas sobre minha identidade, minhas dúvidas sobre minha autoestima. Eu tive a sorte de ter encontrado dois personagens por quem eu me apaixonei muito, que são os irmãos dessa história: o Carlos e a Vitória. Esses irmãos que estão vivendo numa mesma casa, mas não conseguem se comunicar e criaram mundos paralelos para sobreviver a essa fase de sobressalto da vida que é adolescer. Vitória encontra um caderno antigo da mãe que é quase um diário e ela vai escrevendo e descobrindo a trajetória da mãe e da avó, a linha dessas mulheres da família. E o irmão cria um perfil falso na internet, porque ele sendo ele mesmo, não consegue ter a atenção que ele gostaria, e a partir desse perfil falso, ele vai tendo mais atenção, mas ao mesmo tempo vai criando mais dilemas éticos.
Quando você escreveu o livro, já teve alguns dos mesmos questionamentos que os personagens do livro?
Nossa, todos. Na minha época não tinha nem Orkut, era ICQ. Eu não tinha um perfil de internet para me esconder. O teatro acabou sendo esse lugar. Eu tinha muita dificuldade em me comunicar, eu era muito introspectivo e ao colocar um personagem em uma peça de teatro, me libertava. Mas depois de um tempo, o personagem do teatro não bastava porque eu sentia que eu tinha uma voz e eu queria falar por mim. Então eu encontrei muito essa semelhança nesse personagem que vive hoje, em 2022 e a minha adolescência. Eu acho que é um processo que muita gente vai se identificar. Se você não encontra logo os recursos para ir sobrevivendo, se você não for extrovertido, se você não tiver um grupo de amigos e uma rede de relação que vai te levando, você acaba entrando nesse ciclo.
Você acredita que esse livro também pode ajudar os seus filhos a lidarem com essas emoções na adolescência?
Ai caramba, não sei (risos). Eu escrevi muitos livros inclusive pra eles. Eles não estão nessa fase da vida ainda, mas já leram o livro. Eu acho que uma das mensagens que eu queria muito que eles absorvessem é essa parceria entre irmãos que o livro fala, que os personagens demoram a conquistar. Também tem uma coisa muito bonita que é a maneira com que eles olham para os pais deles, a maneira com que os pais têm facilidade e dificuldade de se comunicar e se conectar com eles. Esse livro fala muito também sobre qualidade de comunicação. E a gente que vive uma época onde está cada vez mais difícil de se comunicar e se conectar, manter uma comunicação sadia. Eu acho que ele é um estímulo a isso para todo mundo. E numa linguagem muito divertida, do jeito que eu gosto e sei escrever. Eu gosto de fazer um livro que tem humor, que emociona, que tem referências onde todo mundo identifica. A última cerejinha desse livro foi fazer umas playlists para cada capítulo pra pessoa conseguir ler, escutando as músicas temáticas. Espero que as pessoas curtam porque a gente fez com muito carinho. Inclusive fazendo muitas homenagens à gente legal da nossa música mundial, que eu tenho vontade que as pessoas escutem assim de Cesária Évora, Emicida passando por Beyoncé, passando por artistas Independentes que muita gente ainda não conhece. Faz parte dos estímulos que o livro quer publicar.
Como você decidiu encaixar o contexto pandêmico na história?
A pandemia não estava no livro. Eu escrevi o livro todo e eram só dois irmãos que moravam na mesma casa depois eu pensei ‘todo mundo viveu essa experiência junto, a gente sabe muito bem o que é sensação de afastamento, de confinamento, de não poder se aproximar das pessoas’, aí eu trouxe para o livro e ganhou uma outra camada. No final das contas fez todo sentido, não é protagonista, não é o principal da história, mas acaba que nos uniu também nas experiências que todo mundo viveu recentemente.
Você diria que esse livro também pode ser voltado para os pais fazerem reflexões?
Eu vou contar um segredo (risos), quando eu escrevo um livro, não faço a menor ideia para que idade é o livro e alguém que me diz isso depois e eu vou organizando. Quando eu comecei a escrever, eu não fazia a menor ideia que era um livro considerado para adolescente. Acho que isso acaba acontecendo uma coisa legal, dessa minha incapacidade de direcionar para um público, acaba que ele fala mais do que com um público pretendido e isso eu já aprendi com os livros infantis. Esse é a mesma coisa. Os leitores são muito variados. Ele tem uma idade indicada, mas os adultos que leram estão me dando retornos impressionantes, então trazendo para si. Porque esse livro ele tem personagens periféricos como tios, pais, amigos, que tem outra faixa etária e traz encontros de identificação de mensagens que as pessoas pegam.
Como você tem recebido os retornos de novo livro pelos leitores?
Esse retorno na verdade começa antes de eu publicar porque tem uma coisa que eu já faço a anos com os meus livros. No caso dos livros infantis, é enviar o meu texto para uma escola pública em uma particular, sem saber que eu sou o autor e sem ilustração, e os jovens comentam. Esse meu livro foi a mesma coisa. Eu tive três consultorias, dois filhos de amigos, um menino e uma menina que estão nessa fase da vida, que leram e trouxeram insights, e um grupo de teatro aqui do Rio de Janeiro, que recebeu o texto também sem saber que era meu, somente a diretora do grupo de teatro. E eles fizeram uma coisa linda no meio da pandemia, me apresentaram o livro através de cenas, que eu assisti através do Zoom e fizeram provocações. Foi muito legal porque é uma voz que você já começa a ouvir antes de publicar. Agora que publicou, as pessoas têm identificado ele muito como uma boa companhia, de uma leitura que passa rápido e gostosa e acaba sendo um livro que cada um se apropria dele de uma maneira. O tema dele, eu falo que é comunicação, ética, formação da identidade, mas tem gente que lê e identifica outras coisas porque é um livro de múltiplas sensações. Eu acho isso muito poderoso.
Você se inspirou em alguém para criar os personagens da obra?
Não, mas tem várias histórias que são minhas, que eu vivi e tá na boca dos personagens ou contada de outra maneira. Vai ser até um jogo para as pessoas lerem e tentar adivinhar o que eu experimentei ou não. O livro tem várias pequenas aventuras, várias coisas que são minhas ou histórias que eu ouvi de pessoas que passaram pela minha vida. Eu queria muito que esse livro fosse uma conexão entre os meus livros infantis e o ‘Na minha pele’. Muito para formar uma cadência de identificação e fortalecimento da nossa autoestima. Meu esforço todo para criar uma linha de fortalecimento da nossa identidade da nossa autoestima.
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