Nascido no bairro de Pirituba, zona oeste de São Paulo, Machado é o caçula de uma família com quatro filhos. Parte da infância de Luciano foi em um cortiço, com banheiro compartilhado. Aluno de escola pública, conseguiu a oportunidade de estudar em uma ótima escola, que tinha um núcleo negro no período matutino.
Seu pai foi pedreiro, ajudante de obras, e um tempo depois, teve a oportunidade de empreender, se tornando um médio empresário, transformando a vida da família. Sem o suporte necessário, e enfrentando diversas crises econômicas pelas quais o Brasil passou, seu negócio quebrou, mas inspirou Luciano a empreender no segmento de construção, e fazer diferente, com base nas lições aprendidas.
Luciano sabia que sua empreitada não seria fácil, e buscando aprender, foi trabalhar numa pequena empresa, para entender a dinâmica.
Ciente de que seria preciso uma base sólida de formação, se matriculou num cursinho da USP, o NCN (Núcleo de Consciência Negra, com professores negros, que tinha por objetivo ajudar alunos negros entrarem na faculdade pública).
“O NCN foi fundamental na minha construção. Você vai pra um ambiente totalmente negro, pra se preparar, com todo mundo com o mesmo objetivo. Lá, aprendi muito sobre história negra, nossas origens, beleza negra, autoestima, e a andar de cabeça erguida. Foi como se eu tivesse ido me preparar para uma luta de 6 anos, que viria durante a faculdade”, afirma Machado.
Luciano se matriculou em uma faculdade de elite, mas foi bem na época da falência do seu pai. Pleitearam e conseguiram uma bolsa de estudos parcial, para que Luciano continuasse sua formação acadêmica.
Em 1996, na faculdade aprendeu a jogar o jogo. Com 4 turmas de 50 alunos, dos cursos de engenharia, era um dos dois únicos negros que havia em toda a turma de 200 pessoas. Nessa época, se sentia um estranho no ninho, pois era o único que trabalhava em um estágio para ajudar a custear seus estudos. Andava quilômetros pra comer um lanche, no intervalo entre a faculdade e o trabalho.
“Na faculdade, entendi o que era riqueza. Falava-se de jatos, fazendas, num ambiente completamente diferente do meu, onde tive que entender e me situar, que não poderia fazer o que eles faziam, assim como os demais alunos não entendiam o fato de eu trabalhar, enquanto estudava”.
Machado se formou Engenheiro Civil, pela Universidade Mackenzie, em 2002. Como na época trabalhar com engenharia, sem experiência e sem indicações não era fácil, viu a oportunidade de trabalhar no segmento bancário, e aplicou para vagas no setor.
“Meus períodos nos bancos foram fundamentais pra entender um monte de coisas, que hoje uso no meu dia a dia. Trabalhei na área administrativa, e em negócios na área jurídica. Lidei com muitos empresários, vi muito deles ficarem ricos e outros falirem. E aprendi o que fazer e o que não fazer pra sua empresa dar certo”afirma.
Além do segmento bancário, Luciano também passou um período atuando em operadoras de telecomunicações, e decidido a retornar para a área de engenharia, decidiu aplicar para vagas na área comercial. Fez uma rodada pelas grandes construtoras de São Paulo, e por falta de experiência, ouviu muitos nãos. Quando veio seu sim, foi trabalhar na divisão de cimentos de uma grande construtora, e lá ganhou experiência.
“A estrutura é feita pra gente não esteja na engenharia. Existe uma grande armadilha: exatas é difícil, e a gente se afasta dessas disciplinas. Se a gente parar pra pensar que as pirâmides foram feitas no Egito, somos descendentes de grandes pensadores da construção civil. Os engenheiros estão no topo das listas dos mais ricos do mundo.”
Para Luciano, qualquer coisa que a gente utilize em termos de tecnologia ou desenvolvimento, passou por um engenheiro. “A engenharia é pra nós. Meu papel hoje é quebrar o paradigma que matemática ou física são difíceis. Engenharia é treino. E pra mudar a estrutura, temos que trazer as novas gerações, pra entender esse negócio. Faz parte da nossa ancestralidade. Fomos construtores das obras mais antigas, que existem até hoje.”
Com a experiência adquirida no segmento, junto com 3 sócios, fundou a MMF Projetos, uma consultoria de projetos de infraestrutura. É responsável hoje por grandes projetos de saneamento e infraestrutura, como pontes, viadutos, geotecnia, grandes estruturas, e tudo mais relacionado a esta área. Atendem clientes públicos e privados, numa carteira mista. Grandes organizações públicas contam com os projetos da MMF.
Ao longo dos últimos anos, à frente do seu negócio também enfrentou grandes crises, principalmente no segmento de construção e infraestrutura. E com a experiência adquiria, consegui extrair de todas elas grandes oportunidades.
Conseguiram nascer e, também, crescer na crise. Desde a fundação, há 8 anos, seu negócio não para de crescer. No último ano dobraram de tamanho, e já prevê outra dobra para 2022.
“O mercado está aquecido e cheio de oportunidades. Projetos e capital disponível no segmento de infraestrutura. Quem, assim como eu, conseguiu alcançar uma posição, que não é estruturada pra nós, tem o papel de trazer outros. Quebrar paradigmas de que não temos que estar nesse lugar. Acelerar empresas de jovens empreendedores, startups negras. Penso todos os dias que fora da minha empresa tenho uma responsabilidade, e ajudar, dar a mão e ser referência”,ressalta.
Ainda hoje, entende que o futuro está na educação. Com MBA de ADM na FGV, uma especialização em Engenharia Geotécnica, Luciano também se graduou durante a pandemia em filosofia. “Nossa ancestralidade dos construtores de pirâmides precisa ser resgatada. Eles fizeram muito pela nossa história, e precisamos tomar posse, eu acredito”, finaliza.