Se você é preta e esta passando pelo processo de transição capilar, tem dúvidas ou quer dividir sua experiência, esse texto e esse espaço são para você!
Por Cris Santana – Blogueira de Santos, militante e muito gata *
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Alguns dizem que não se pode falar da transição capilar do cabelo crespo, sem falar de racismo, solidão, insegurança entre outros assuntos que afligem mulheres negras, e durante o processo de transição muito mais. Bom, concordamos com isso e acrescentaríamos que trazer sua experiência pessoal para o texto também é de extrema importância, além do que, toda mulher em processo de transição precisa de apoio e referências que a motivem a continuar.
Um resumo do meu processo de transição…
Quando eu resolvi libertar meu cabelo da química, tive o apoio da Lu Reis, acredito que sem o incentivo dela eu não teria tido coragem de dar inicio ao processo.
No final de 2012 parei com as químicas, isso deixou meu cabelo fraco, a chapinha já não dava o resultado “liso perfeito” que eu buscava, na verdade nunca deu, eu que me iludia achando que sim e estava tudo bem.
Como ele ficou metade crespo e metade alisado resolvi colocar trança nagô, aquelas tranças enraizadas, pois elas ajudariam o cabelo a crescer mais rápido e eu já estava mega ansiosa para ver meu cabelo todo natural. O problema era a demora dele crescer, obviamente, pois eu não queria corta-lo “joãozinho”. Como sofri muito racismo na escola quando criança por causa do meu cabelo e da minha cor, na minha imaginação corta-lo seria uma espécie de trigger e eu ia me sentir feia.
No começo de 2013 quando resolvi tirar as tranças e vi que o cabelo não tinha crescido quase nada e eu não estava com aquele black power, tive uma crise existencial e entre o “cortar ou não cortar, eis a questão” eu pedi para minha prima passar a tesoura em casa e isso ela fez.
Bom, primeiramente quero dizer que depois que eu assumi minha negritude – isso inclui usar as tranças enraizadas, não só cortar o cabelo -, nunca mais fui cumprimentada pelo porteiro do prédio que eu trabalhava na época, nunca mais fui assediada na rua com um “nossa, que ~~morena~~ linda” ou “Oi ~~morena~~, passa seu telefone?” e todas as outras bostas que a gente escuta por ai. Não que isso tenha me feito sentir mal, eu agradeço aos orixás até hoje por esse avanço, mas todo mundo sabe que essas mudanças no comportamento das pessoas, em especial duzomi, pode mexer com a autoestima de algumas mulheres.
E mexeu muito com a minha, mas também me deu raiva, muita raiva conviver com os olhares, perguntas principalmente às risadinhas das pessoas que me viam passar.
Minha força veio da raiva, da insegurança, pois eu não ia voltar atrás na minha decisão e entender que meu cabelo incomodava as pessoas me fez entender que a estética não era a coisa mais importante. Meu cabelo nunca foi liso ou cacheado, e sim crespo e muito volumoso, e essa estética que eu me refiro é a padronizada, cabelos extremamente lisos, franjinhas e todo aquele mimimi que vemos na TV. Essa estética nunca me pertenceu e entender isso foi como avistar um novo horizonte e a partir daí, eu descobri então que meu cabelo é uma extensão da mulher que sou e também um ato político, e essa frase faz tanto sentido a cada dia que passa na minha vida como um “eu te amo” dito com sinceridade.
A verdade sobre a transição:
Não acredito exista uma verdade absoluta, para mim foi um processo meio difícil, para outras garotas nem tanto, para outras muito. Por esse motivo é que precisamos de apoio, inclusive com essa onda dos cachos perfeitos. A verdade é que nem toda mulher crespa em transição vai ter cachos, que dirá definidos como algumas ostentam. Meu cabelo tinha cachinhos enquanto estava curtinho, hoje que ele é “aquele black”, não forma cachos e isso só me dá mais alegria, mas para outras pode ser desanimador.
Motivação e aceitação:
Nem todo cabelo é igual, existem vários tipos de crespos com formas e volumes diferentes. Se estiver difícil se firmar na decisão, busque mulheres em quem você possa se inspirar, mulheres simples e com uma realidade próxima a que você vive.
O Facebook é uma ótima ferramenta para conhecer outras minas crespas maravilhosas como você.
Não saímos da ditadura do cabelo alisado, para entrarmos em outra, a dos cachos perfeitos, não é mesmo? Isso inclui que ter frizz é natural. Todo cabelo crespo, em geral os 4A, 4B e 4C tem frizz e se isso for muito incômodo, existem várias técnicas para amenizá-los.
Uma boa hidratação pode ajudar, inclusive.
Opções e dicas:
Se o big chop não for uma opção para você e seu cabelo estiver metade crespo, metade liso, não precisa se desesperar pois não é o fim do mundo.
Bom, existe uma lenda de que cabelo crespo demora muito para crescer, mas eu discordo. Ele cresce como todos os cabelos, a diferença é que seja ele super cacheado ou não ele encolhe á medida que cresce. O fator encolhimento faz a gente entrar numa angustia terrível. Uma boa dica para que seu cabelo possa crescer mais rápido ou sem que você sofra tanto com esse processo que pode demorar um ano e meio até ele atingir um tamanho que dê para prender no mínimo, são as tranças. Tranças num modo geral sejam soltas ou nagô, feitas com lã, cabelo sintético ou mesmo os twistes que estão usando muito agora.
Também existe o shampoo bomba, que dizem acelerar o crescimento do cabelo e a receita você encontra com facilidade na internet, porém não existe comprovação ciêntifica da sua eficácia.
Pode-se usar os turbantes, que são uma forte ferramenta de empoderamento sobre negritude e cultura, sem contar que existem vários tipos de amarrações que valorizam o cabelo, o volume e a beleza da mulher negra.
Créditos: Trança na nagô
Liberte-se:
É maravilhosa a ansiedade por descobrir que tipo de cabelo é o seu crespo, se vai cachear ou não. Buscar beleza onde a sociedade diz que não tem quando uma mulher corta o cabelo curtinho, pois existe uma conversa meia boca por ai, que mulher de cabelo curto perde a feminilidade, isso é uma grande balela!
Normalmente, é nessa fase que começamos a abusar nos detalhes, como por exemplo, no baton que passa daquele rosa apagado, para o vermelho sangue e os brincos quase invisíveis, para os brincões babado, confusão e gritaria.
É necessário firmeza na decisão. Por que esta voltando ao natural do cabelo? Se foi alisado na infância ou numa outra fase da vida em que você buscava ser aceita dentro da sociedade racista em que vivemos ou não, é importante saber que “se o cabelo é seu, você faz o que quer” não é uma verdade absoluta, não aqui no Brasil. Qualquer atitude de mudança no seu cabelo deve ser levada a sério, os julgamentos, os olhares, as vagas de emprego que podem ser perdidas por puro preconceito não são invenção da nossa cabeça, acontecem realmente, porém isso não pode ser indicio para você se desmotivar, assuma seu cabelo natural e você vai perceber que apesar de sofrida a vida pode ser vivida com mais leveza e menos preocupações!
4P ♥
* Confira mais textos da Cris no blog Dita Preta Diva.