Pela chef: Aline Guedes
Os menus de final de ano aqui no Brasil costumam quase que impreterivelmente trazer um repertório que se repete anualmente. Somos um povo que aposta no que já é habitual e que, para além disso, cria memórias por meio do alimento. Essas memórias baseiam-se em pratos que se tornam emblemáticos em cada uma de nossas famílias e que preparados nesta época do ano, nos permite ativar as lembranças nostálgicas da infância que tivemos ou de pessoas com as quais tivemos convívio.
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No Brasil, no entanto, há algo me chama a atenção para tal repertório culinário: muitas de nossas mães pretas em seu passado de lutas como trabalhadoras domésticas, aprenderam a cozinhar nestes espaços de trabalho e isso, por consequência, acabou por gerar nelas conhecimentos que a serem transmitidos, mas que não se relacionavam diretamente com sua própria família ou aos que vieram antes delas, os nossos ancestrais. Em minha própria vivência, presenciei essa relação que se desenvolveu em minha família com produções culinárias que não refletiam minha própria existência como mulher negra. Minha mãe foi uma destas pequenas mulheres que desde muito jovem assumiu a responsabilidade financeira de sua casa e que aprendeu a cozinhar o que se comia nas casas em que trabalhou. Nas minhas referências de receitas que costumávamos fazer quando ainda pequena nas festas de final de ano, o bolo de nozes com ovos moles sempre foi o mais desejado e que se tornou meu favorito.
Quando uma pessoa preta no nosso país conquista a consciência racial, também celebra uma liberdade de ser. Hoje, sobremesas coloniais já não são os mais apreciados em minha casa ou nas dos meus. Hoje temos nos conectado com quem somos e com os que vieram antes de nós.
Nossas ceias podem ser fartas, robustas e deliciosas, sem que sejam o reflexo dos que nos colonizaram ou que fomentaram o comércio dos nossos ancestrais quando escravizados. Nossas ceias podem ter ingredientes nossos, tipicamente brasileiros e/ou afrodiaspóricos. Pensando nisso e na liberdade que atualmente temos conquistado em ser quem somos, também por meio da comida, sugiro aqui para vocês uma ceia que ao menos em um dos itens que compõe a mesa tradicional brasileira, possa contemplar nossas raízes. Para as saladas, por exemplo, buscar ingredientes sazonais, da época, já contribuem por um valor mais acessível e um frescor maior. Além disso, para os clássicos como salpicão e saladas a base de molho maionese, pensar em substituições com ingredientes semelhantes, já dá um toque de criatividade à mesa, além de ampliar a gama de possibilidades de pratos que representem quem os produz.
Ao invés da tradicional batata inglesa, por exemplo, já pensou em usar batata doce ou até inhame na construção da famosa salada de batatas com ovos? Ou ainda substituir as uvas passas por outras diversas frutas secas, como tâmaras ou bananas?
Pensando nessas possibilidades e substituições, deixo aqui uma receita prática, fácil e saborosa, que pode tanto ser usada na ceia natalina, quanto na virada de ano. De tão fácil, pode ser preparada em alguns minutos e com antecedência por aqueles que planejam as festas para realmente aproveitarem-se delas.
Espero que gostem:
CUSCOUS MARROQUINO COM FRUTAS SECAS, CASTANHAS BRASILEIRAS E COENTRO
INGREDIENTES:
– 300g de couscous marroquino
– 400ml de suco de laranja
– 4 bananas passas picadas
– 8 tâmaras picadas
– 100g de castanha de caju
– 100g de castanha do Pará
– 100ml de azeite de oliva extravirgem
– Suco de 1 limão cravo
– Sal a gosto
– ½ pimenta dedo de moça picada
– Coentro a gosto
PREPARO:
- Hidrate o couscous marroquino com o suco de laranja aquecido, colocando ambos em uma tigela coberta com filme plástico por aproximadamente 5 minutos.
- Pique grosseiramente as grutas secas e castanhas. Misture ao couscous já hidratado.
- Tempere a mistura com azeite de oliva extravirgem, pimenta dedo de moça picada, suco de limão cravo e sal.
- Finalize com coentro picado grosseiramente e com um pouco mais das castanhas para decorar.
- Sirva levemente refrigerado.