Mundo Negro

Nem o distintivo protege: o corpo negro como alvo permanente

Foto: Reprodução/CNN

Por Luciano Ramos

No dia 11 de julho de 2025, o policial civil Rafael Moura da Silva, um homem negro, foi executado com três tiros por um policial da ROTA durante uma operação na Zona Sul de São Paulo. As imagens que circularam são chocantes: Rafael não estava armado, não estava em fuga, e tinha o distintivo funcional visível no pescoço. Ainda assim, foi tratado como ameaça e alvejado — sem qualquer ordem de rendição, sem abordagem, sem palavra.

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Esse caso escancara uma ferida profunda e conhecida: o corpo negro no Brasil é sempre um corpo sob suspeita. Um corpo que, mesmo quando ocupa um lugar institucional de autoridade, segue sendo lido como perigo, como alvo, como algo a ser abatido.

Não se trata de erro. Trata-se de um funcionamento previsível de um sistema baseado na eliminação seletiva. Um sistema em que o racismo estrutural puxa o gatilho antes mesmo que se veja o distintivo.

O racismo como protocolo não escrito

O policial da ROTA não viu um colega. Não viu um investigador da Polícia Civil. Viu um homem negro, em um beco, em uma favela. E isso bastou.

Nesse sistema, não é necessário comportamento suspeito. Basta a combinação de cor da pele, território e contexto. O resultado é quase sempre o mesmo: morte sem perguntas.

A política de segurança pública não pode continuar operando com esse tipo de “reflexo automático” — onde o que se enxerga primeiro é a cor da pele, e não a pessoa.

Quando nem o Estado reconhece seus próprios

Rafael Moura era policial. Estava em serviço. Tinha o distintivo exposto. E ainda assim, não foi reconhecido como parte do próprio Estado. Isso diz muito sobre o lugar que os corpos negros ocupam nas estruturas de poder: não basta estar dentro. O racismo estrutura até quem é reconhecido como legítimo.

A morte de Rafael não foi uma falha de comunicação. Foi o resultado de um sistema que opera cotidianamente sob a lógica da eliminação seletiva de pessoas negras, mesmo que essas pessoas estejam servindo ao próprio aparato de segurança pública.

Silêncio oficial, conivência política

Até agora, nenhuma medida efetiva foi tomada contra o PM que atirou. Não houve afastamento imediato. Não houve nota pública da Secretaria de Segurança. O governador Tarcísio de Freitas, a quem a ROTA responde, segue em silêncio.

A ausência de respostas não é surpresa. É padrão. Quando a vítima é um homem negro, mesmo com crachá do Estado pendurado no pescoço, o silêncio institucional se instala.

Mas esse silêncio grita. E o que ele grita é perigoso: que vidas negras continuam sendo tratadas como descartáveis — inclusive dentro das instituições públicas.

Conclusão: o que mais precisa acontecer?

A morte de Rafael Moura é um marco cruel. Ela desmonta, de forma incontestável, a ideia de que ocupar espaços institucionais basta para garantir dignidade, segurança ou reconhecimento para pessoas negras.

Se um policial negro, com distintivo exposto, pode ser morto sem chance de defesa, que chance têm os jovens negros sem farda, sem cargo, sem proteção estatal?

É hora de dizer com clareza: nenhum protocolo de segurança pode ser legítimo se continua matando os corpos que deveria proteger.

E nenhuma estrutura estatal é democrática enquanto naturaliza o racismo como método operacional.

Rafael era policial. Era homem negro. Era servidor do Estado. E foi executado por causa da cor da sua pele. Esse fato não pode ser ignorado. Tem que ser enfrentado. Com indignação, responsabilização e mudança.

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