Novo levantamento do SoU_Ciência mostra elites brancas e evangélicos mais descrentes da vacina, da ciência e das universidades públicas do que outros segmentos
O levantamento nacional de opinião mais recente, realizado entre julho e agosto de 2022, pelo Centro de Estudos SoU_Ciência, permitiu identificar algumas tendências de comportamento da população brasileira em relação ao tema das vacinas e uso das máscaras, entre outros assuntos relacionados à pandemia. Mais pobres, menos letrados e negros, confiam mais na ciência, na vacina e no SUS, enquanto mais ricos, mais letrados e brancos estão mais descrentes.
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O levantamento aponta que entre os que não tomaram vacina ou apenas uma dose são: 41% dos mais ricos, 32% dos com ensino superior, 29% dos brancos e 29% dos homens. Enquanto os mais pobres, menos letrados, mulheres e negros tiveram níveis de adesão superiores.
De acordo com a professora Soraya Smaili, uma das coordenadoras do Centro de Estudos “a porcentagem negacionista ou apenas displicente se concentrou na alta renda e nível superior de escolaridade. O corte ideológico, pró-Lula ou pró-Bolsonaro, é outro marcador relevante”, explica.
A pesquisa mostrou que fatores políticos influenciaram as decisões sobre a vacinação e o uso de máscara no contexto da pandemia, em especial relacionados ao apoio ou não ao atual governo federal. 37% dos eleitores de Bolsonaro declararam ter tomado apenas uma ou nenhuma dose da vacina, contra 10% dos eleitores de Lula. O levantamento também apontou diferenças regionais: moradores do Centro-Oeste do país são os que indicam menor adesão à estratégia da vacinação contra Covid-19 (30% das pessoas).
Nesta mesma pesquisa, 1⁄4 da população brasileira com mais de 16 anos declarou ter tido Covid, com destaque para as pessoas com 50 anos ou mais (38%). Entre as pessoas que declararam ter tido Covid-19 ao menos uma vez, além das pessoas com mais de 50 anos, destacam-se as de maior escolaridade (31% com ensino superior) e maior renda (42% das pessoas com mais de 6 salários mínimo). Os dados também revelam que quase o dobro de homens precisou ser internado se comparado a mulheres (22 a 12%).
Pedro Arantes, um dos coordenadores do SoU_Ciência, explicou que há diversas variáveis a serem consideradas, como a facilidade ou não de acesso à rede hospitalar, apesar da ampla cobertura que o SUS alcançou para internações em vários estados. “Mesmo sem considerar essa possível restrição à demanda por internação, o dado do levantamento é ainda relevante para destacar, que homens, mais ricos e mais instruídos foram ao mesmo tempo os que optaram por serem os menos vacinados e os que acabaram sendo os mais internados. Dados epidemiológicos e de internação também confirmaram essa correlação”, ressaltou.
Do total dos entrevistados, 3% indicaram ter usado medicamentos do kit, como cloroquina e ivermectina. Já, 21% declararam que sabem não existir qualquer recomendação científica para o seu uso. No entanto, a adesão ao kit cresce entre bolsonaristas. 28% que disseram ter sido infectados entre os que avaliam como ótimo ou bom o atual governo federal, 9% tomou o kit. Já entre os que consideram a gestão Bolsonaro ruim ou péssima, dos 20% infectados apenas 0,18% tomaram o kit. Entre os 25% de evangélicos e 22% de católicos infectados, há também diferença relevante: 7% dos evangélicos tomou o kit contra apenas 1% dos católicos.
A melhor avaliação do governo na condução da pandemia advém dos segmentos: homens, brancos, com mais de 40 anos, moradores do Centro-Oeste, evangélicos, de nível superior, com mais de 6 salários mínimo. Dos eleitores de Bolsonaro: 74% consideram a condução na pandemia ótima e boa, contra menos de 2% de aprovação entre eleitores de Lula. Já entre eleitores de Ciro, 43% consideram a condução regular.
Os dados do levantamento mostram que a polarização política na sociedade brasileira tem marcadores de classe, gênero, raça, religião e faixa etária importantes. 46% dos mais ricos consideram a atuação do governo como boa ou ótima, diante de apenas 14% dos entrevistados com até 1 salário mínimo de renda. Segundo Pedro Arantes, essa diferença de percepção é decorrente das diferentes condições socioeconômicas: “Os mais ricos tiveram como se proteger melhor na pandemia, pois moram melhor, puderam em geral trabalhar em home office e receber em casa por entrega o que necessitavam. As pessoas mais pobres foram as mais expostas, mais penalizadas com perda da renda, com a volta da fome, com a falta de espaço adequado para ficarem isoladas em casa, com as dificuldades de estrutura para suas crianças estudarem online”.
A pesquisa também constatou que a maioria das mulheres (55%) consideram que a condução do governo foi ruim ou péssima, frente a um percentual menor que a metade dos homens (43%).