Em entrevista à TV Globo, cedida exclusivamente ao Mundo Negro, o ator Guthierry Sotero, escalado para interpretar Júnior em ‘Três Graças’, a próxima novela das nove, revelou detalhes sobre a construção do personagem e as referências que buscou para dar vida a ele.
“Assim que recebi e li o roteiro, senti que precisava rever ‘Justiça 2’, porque o Balthazar (Juan Paiva) tinha umas questões parecidas. Busquei algumas coisas do Jharrel Jerome, ele tem um sensibilidade e atitude ímpar como ator que me cativa bastante, o Ashton Sanders também tem uma individualidade muito interessante, ele em ‘Moonlight’, ‘Filho nativo’ e ‘Dias sem fim’ me inspira muito no quesito criação”, conta.
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Depois dar vida a Nastácio em ‘No Rancho Fundo’, Guthierry vive Júnior, um jovem que trabalha com computação, estudioso e batalhador. Sua vida é diretamente afetada pelo esquema de falsificação de remédios liderado por Santiago Ferette (Murilo Benício). Ele perde o pai, que tomava os remédios sem efeito da farmácia da Fundação Ferette na Chacrinha, comunidade fictícia da novela, em São Paulo. Após o falecimento de Albano (Cosme dos Santos), Junior está disposto a combater as maldades que estragam a vida de famílias como a sua.
Criada e escrita por Aguinaldo Silva, Virgílio Silva e Zé Dassilva, ‘Três Graças’ tem previsão de estreia em outubro.
Confira a entrevista completa abaixo:
1 – Como foi receber o convite para participar de ‘Três Graças’ pouco depois de se despedir do Nastácio de ‘No Rancho Fundo’?
Foi marcante demais para mim. Eu fiquei sem reação, desabei em lágrimas. Tem sido lindo todo esse processo de reencontrar amigos de outras produções e de sentir que está todo mundo se ajudando nessa nova empreitada. Esse foi o meu primeiro convite para um projeto e é algo que parecia muito distante para mim. Trabalhei e estudei muito para que esse momento chagasse e quando aconteceu, lidei com a síndrome do impostor: Será que sou digno? Quando na verdade tudo o que eu mais queria era esse momento, poder mostrar o que sei e me divertir no horário mais nobre da TV brasileira. Estou muito feliz!
2 – Como descreve o Júnior? Quais são as principais características dele?
O Júnior é um homem íntegro, família. Apesar das adversidades é muito alto astral, ‘correria’ e faz de tudo para que o pai se sinta bem. Ele teve de amadurecer mais cedo para poder ajudar em casa e essas características conversam muito comigo, com os meus amigos e com diversos jovens desse Brasil. O Júnior (até onde eu li) tem tido uma trajetória muito linda! Acredito que muitas pessoas vão se identificar, criar empatia e terão muito afeto e respeito por ele.
3- Como se preparou para interpretá-lo? E quais referências buscou?
Comecei pela prosódia porque foi algo que me desafiou de início. Achei mais difícil que o sotaque para ‘No Rancho Fundo’ e também quis uma voz que me distanciasse do Nastácio. Consegui.
O Júnior é muito coração, eu iniciei o trabalho com ele pelo afeto, olho no olho e simpatia. Um fato engraçado é que indo para São Paulo gravar a minha 1º diária, eu ainda não tinha encontrado o caminhar desse cara trabalhador com muitas demandas no dia, mochila pesada andando pela cidade o dia inteiro. E no aeroporto vi um menino gringo de uns 18, 19 anos andando com a família (provavelmente atrasados) com o andar curvado, meio pesado e pensei: “é isso, encontrei o corpo que faltava!”.
As referências me ajudaram muito a ter um norte, assim que recebi e li o roteiro, senti que precisava rever “Justiça 2”, porque o Balthazar (Juan Paiva) tinha umas questões parecidas. Busquei algumas coisas do Jharrel Jerome, ele tem um sensibilidade e atitude ímpar como ator que me cativa bastante, o Ashton Sanders também tem uma individualidade muito interessante, ele em “Moonlight”, “Filho nativo” e “Dias sem fim” me inspira muito no quesito criação. Tenho uma característica com ele em relação ao olhar, temos o olhar “forte” e aí é entender como fortificar/suavizar esse olhar em cena, isso traz camadas ao personagem. Falar em lugares em que ninguém me conhece com o sotaque paulista tem sido um grande laboratório também.
4 – O personagem se relaciona com a Maggye (Mell Muzzillo), uma jovem de classe social bem diferente da dele. Como estão construindo essa relação?
Eles partem do amor. A história de vida é diferente, a classe social aparta ainda mais os dois, mas sinto que eles se encontram no afeto. A relação deles começa de uma forma inesperada e acontecem alguns empecilhos que impedem a aproximação imediata dos dois, mas as cenas deles juntos têm uma beleza cativante, um carinho, gentileza, muitas coisas não ditas estão no ar nas cenas deles. Estou feliz de ter a Mell [Muzzillo] nesse processo e está sendo muito linda essa construção. Tivemos nossas preparações, partilhamos ideias e tem sido muito gratificante essa criação. No fim das contas dizem que o amor sempre vence e essa história tem muito para acontecer. Aguardando as cenas dos próximos capítulos…
5 – Você teve mudanças no visual para o personagem? Como foi esse processo?
Eu estava com o maior cabelo que já tive na vida, mudei bastante os penteados; estava de trança no dia da caracterização. Optamos pelo corte americano no Júnior, mas com uma máquina alta. Ele é jovem, descolado mas também não é mega vaidoso de cortar o cabelo semanalmente, ele tem muita demanda para pensar nisso. Chegamos num denominador comum, eu, direção e caracterização, e estamos muito satisfeitos com o resultado final.
6 -E qual é o maior desafio desse papel na sua carreira? É o seu papel de maior destaque até agora?
Passar as verdades, emoções e sentimentos do Júnior. Ele é um cara sensível, mas que não demonstra, e isso me fascinou desde o início porque eu também sou assim, então tem sido um grande esforço para fazer acontecer, mas um esforço bom. Sinto que venho trabalhando bem nos últimos anos e esse é o maior personagem em termos de trama, enredo e aparição numa novela. E se tratando do horário nobre a responsabilidade triplica. Esse é o meu maior personagem até agora sem nenhuma dúvida e eu estou gostando muito dessa responsabilidade, eu amo o que faço e sempre quis essa oportunidade. Agora que ela chegou é trabalhar para dar o meu melhor e que as pessoas possam amar o Júnior assim como eu o amo. Essa novela é recheada de veteranos e eu amo fazer novela, porque ela te traz essas possibilidades, sabe? Quando eu poderia imaginar que no mesmo trabalho eu contracenaria com a Sophie Charlotte, Marcos Palmeira, Miguel Falabella e tantos outros? Só uma novela alcançaria esse feito e, por isso, estou muito feliz com essa nova empreitada na minha carreira, em poder ver essas pessoas trabalhando de pertinho.
7 – O que mais te atraiu no Júnior? Ele é parecido com você em alguns aspectos?
O afeto. O amor que ele tem com o pai é algo que eu consegui recuperar no decorrer da vida e tem sido ótimo para mim, porque o Júnior é a idealização de relação paterna que eu sempre quis ter para mim e só venho conseguindo depois de adulto. Naturalmente a vocação dele para o trabalho, a vontade de ajudar o próximo, o não desanimar com os percalços da vida e a gana de “vencer na vida” é algo que cativa. Tem sido lindo trabalhar nesse corpo as perspectivas que normalmente delimitam sobre os corpos negros. Estou muito feliz em ter essa oportunidade de poder dialogar com milhões de “Júnior” diariamente no horário nobre.
Assim como o Júnior, por conta dos problemas da vida, eu também tive que amadurecer mais cedo. Comecei a trabalhar aos 18, mas já com a responsabilidade de ajudar em casa. Na pandemia eu que segurei as pontas, eu me vejo nesse cara. Muitas pessoas vão se identificar e ter empatia com o Júnior, porque ele é uma realidade na sociedade, não é um personagem puramente inventando, ele existe, ele está no metrô, no ônibus lotado, nas favelas; ele é o vizinho de muitas pessoas que vão assistir a essa novela.
8 – A novela começou com gravações em São Paulo. Como foi filmar nas locações da cidade e qual a importância dessa ambientação?
Foi ótima para entender como funciona aquela região. Eu fiz questão de treinar a prosódia com alguns amigos de lá, e assim que pisei na cidade falei apenas com o sotaque paulista. Ouvir as pessoas, trocar com os motoristas de aplicativos, as senhoras no mercado e tantos outros momentos, sem dúvidas, ajudaram nessa construção do que seria o Júnior. A cidade de São Paulo é muito diferente do Rio, tanto culturalmente quanto socialmente falando. Aqui no Rio, na Zona Sul, você encontra a madame e o morro no mesmo local. Em SP, o contraste é muito notório e isso naturalmente gera um desconforto. Então, sentir isso na pele foi bom para criar a casca necessária para o meu personagem.
9- Na sua opinião, o que o público pode esperar de Três Graças?
O público pode esperar uma história sobre pessoas, estamos falando de vidas brasileiras, ou seja, essas questões tratadas na trama existem e elas estão próximas de mim, de você ou de qualquer outra pessoa. Embora se trate de uma ficção, a trama da novela é inspirada no que acontece no dia a dia, os personagens são identificáveis e digo isso no sentido de, concordando ou discordando, essa pessoa existe e ela pode ser você, seus familiares ou vizinhos. Terá muita reviravolta, comédia, drama e acredito que a história seja muito empática, as pessoas vão se ver na tela. Estamos chegando em outubro e espero que o Brasil possa amar/odiar os personagens de Três Graças com todo o coração!