Mundo Negro

Economia negra: A abundância existente na escassez

Depois de passar por duas mentorias, venho analisando por que  optei por seguir as reflexões de Lala Deheinzelin, e atuar nas oportunidades que a economia criativa oferece para o crescimento de uma região. No meu caso, os negócios étnicos e de periferia, segmentos que a sociedade considera esquecido e sem possibilidade de geração de desenvolvimento econômico. Atuar com os negócios étnicos, trabalhando simultaneamente o fator econômico e  interação social, é o diferencial competitivo do afro empreendedor, um vez que  esses tem experiência para atuar com mudanças  estruturais e vivencia  nas realidade de escassez.

Se um dos  princípios da  economia colaborativa, é  reduzir a desigualdade social no mundo, estimular os negócios étnicos é alimentar e atender uma demanda especifica que não só mobiliza economicamente, mas traz dignidade e humanidade a regiões esquecidas. Alguns autores da área, dizem que podemos entender como empreendedor aquele que inicia algo novo, que vê o que ninguém vê, enfim, aquele que realiza antes,  que sai da área do sonho, do desejo, e parte para a ação. Makota Valdina, uma empreendedora do ser, sempre diz que ao construir algo, precisamos achar o “nossos jeitos”. Vendo a forma como alguns dos nossos, vem se mostrando pelas redes e vendendo soluções que em nada se diferencia dos modelos tradicionais, me vem a questão. Qual o nosso jeito de ser no empreendedorismo? O que é ser Afro empreendedor? Como investir em negócios étnicos? O que precisa ser levado em conta quando falamos destes?

Notícias Relacionadas


O economista austríaco Joseph A. Schumpeter, no livro “Capitalismo, socialismo e democracia”, publicado em 1942, associa o empreendedor ao desenvolvimento econômico. Para ele, o sistema capitalista tem uma força que ele denomina de processo de destruição criativa. Segundo o mesmo, essa se fundamenta no princípio que reside no desenvolvimento de novos produtos, novos métodos de produção e novos mercados; em síntese, trata-se de destruir o velho para se criar o novo. Ou seja,  empreender levando em conta sua realidade, repertórios e valores. É cada vez mais comum encontrar  Afro empreendedores que ao invés de seguir seu jeito de olhar pro passado para construir o futuro, vem tentando se enquadrar neste modelo caixinha empreendedora que conhecemos como aceleradoras.

A questão é que cada dia mais, percebo que  empresas étnicas não se enquadra neste modelo de aceleração. Nossa tecnologia é de ressignificar a escassez e transformar essa em lucro.

Nossas empresas não visam somente lucro, elas atuam no impacto pessoal com o objetivo de sustentabilidade. Um afro empreendedor quer ganhar dinheiro, mas não sem desenvolver sua comunidade. Se uma empresa negra é pensada sobre outra ótica, ela não é um negócio étnico e sim um negócio de apropriação dos referenciais étnicos. Digo isso com a serenidade de quem vem  analisando  negócios virtuais  que atuam com  a auto estima negra ou tem em sua equipe de RH  profissionais negros e a realidade é que esses ainda são os profissionais de baixo escalão, sem grandes chances de opinião ou decisão mesmo com o uso de elementos que o exalta ou resolve problema de visibilidade.

O empreendedorismo tradicional, dirá que para nossos negócios dá certo,  temos que  sustentar nosso  modelo e fundamentar com  análises e dados factíveis via comparação com negócios similares. O problema é que  dados sobre o mercado negro, ainda são tímidos ou inexistentes. Não sabemos a viabilidade econômica  e potencial de mercado dos nossos bairros, por exemplo. Não sabemos quais demandas, nossas comunidades necessitam e isso acaba por fazer com que mesmo com movimentações financeiras significativas, ainda sejamos um mercado disperso e desconhecido. O bom é que mesmo assim, colocamos nossas empresas na rua.

Nossos negócios ainda que tenham baixa lucratividade, tem um grande potencial de crescimento se bem orientado e sem perder os nossos “jeitos”. A cada mentoria, fui vendo o MercAfro sair do que eu queria  e indo para que o mercado considerava central para ele dá certo. Ao perceber que estava perdendo o meu jeito,  tomei coragem de  redefinir  a maneira de  pensar  e dividir  com quem pensa e faz o mesmo, ou seja, resolvi apostar no  impossível. Se existe uma palavra que provoca e traz sucesso e realização pra a vida de um afro empreendedor, essa palavra é impossível. Fizeram isso com a politica de cotas, fizeram isso em diversas áreas sociais e agora parcela desta população vem fazendo o mesmo ao ocupar parcela do mercado, revisitando sua história para contar e produzir de forma mais atual.

A cadeia de valor dos negócios étnicos,  vem ressignificando seu modo de atuar. É preciso agora entender que suas comunidades, é um potencial de abundância econômica se virarmos a lente e olhar essas sobre a ótica de compartilhamento, tendo como bases nossos  jeitos negros de ser e fazer. O relacionamento econômico com os clientes negros e étnicos  mudou,  e isso traz uma grande  possibilidade de se libertar de um olhar de escassez e  ganhar o mercado. Precisamos entender que a economia global, aos poucos deixa para trás o princípio do hiper consumo e  sucesso financeiro desenfreado, para pensar crescimento de empresas com  impacto social e neste quesito, as empresas e negócios negros é o grande garanhão desta corrida eternamente branca.

Luciane Reis é publicitária, design instrucional  e pesquisadora de etno –desenvolvimento voltado para economias vulneráveis pelaUniversidade Federal da Bahia.

Notícias Recentes

Participe de nosso grupo no Telegram

Receba notícias quentinhas do site pelo nosso Telegram, clique no
botão abaixo para acessar as novidades.

Comments

Sair da versão mobile