No início deste ano uma polêmica surgiu após a divulgação dos indicados ao Globo de Ouro 2020. A aclamada série “I May Destroy You” ficou de fora da premiação, ainda que fosse considerada uma unanimidade por crítica e público.
A série exibida pela HBO é escrita e estrelada pela inglesa Michaela Coel, de 33 anos, e conta a trajetória de Arabela, uma escritora e influencer que após ser drogada e sofrer abuso sexual precisa reconstruir todos os lapsos de memória sobre a noite traumática. Esse roteiro é baseado na experiência real de Coel enquanto ela estrelava a série ‘Chewing Gum’ (também escrita por ela) o que já seria o suficiente para chamar a atenção, mas além desse fator, a série passeia com naturalidade entre o drama e o humor, trazendo coadjuvantes com questões tão angustiantes e identificáveis para o público quanto a sua protagonista.
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Mas como a série virou o estopim para derrocada do Globo de Ouro?
Com a ausência de ‘I May Destroy You’ entre os indicados do ano passado, se levantou o questionamento da razão de séries menos aclamadas terem sido indicadas como, por exemplo, a produção bobinha exibida pela Netflix ‘Emily em Paris’. Em tempos que se busca por representatividade, muita gente da indústria apontou que a HFPA (Associação de Imprensa Estrangeira de Hollywood, entidade que organiza o Globo de Ouro) continuava a repetir os erros de anos anteriores, e agora de forma ainda mais escandalosa, pois além da produção ser escrita e dirigida por uma jovem estrela negra em ascensão, é de uma qualidade indiscutível.
Para se ter uma ideia I May Destroy You recebeu oito indicações ao Bafta, prêmio mais prestigiado da Academia Britânica de Cinema e Televisão.
Reportagens do Los Angeles Times revelou que a HFPA não tinha nenhum negro entre seus votantes, o que poderia explicar não só a ausência da roteirista inglesa e sua série das indicações para melhores de 2020 como o inexplicável esquecimento da série “Watchmen”, estrelada por Regina King, embora a série tenha abocanhado nada menos que 11 Emmys, o prêmio mais importante da televisão norte-americana. O mesmo Globo de Ouro esnobou “A Voz Suprema do Blues” como indicado a melhor filme, enquanto o mesmo longa concorreu ao Oscar de Melhor Filme.
Não seria difícil inferir a relação entre os integrantes da Associação serem todos brancos e aclamadas produções lideradas por profissionais pretos serem esquecidas das edições do Globo de Ouro. Então junta-se a reputação dos votantes em receber benefícios de concorrentes para ceder prêmios e foi a gota d´água para Hollywood iniciar a derrocada da premiação.
Netflix, Amazon e Warner Media decidiram que não vão mais manter relações com a HFPA até que a diversidade comece a fazer parte do grupo. Tom Cruise, um dos maiores astros de Hollywood devolveu suas três estatuetas do Globo de Ouro, enquanto Scarllet Johansson denunciou atitudes sexistas de membros da HFPA durante campanhas de divulgação dos filmes.
Diante da pressão, a rede televisão norte-americana NBC decidiu não exibir a premiação em 2022. A exigência é que a organização passe por uma transformação e torne seu quadro mais diverso.
Movimento parecido aconteceu com o movimento ‘Oscar So White’, em 2016 que apontou a falta de diversidade entre os votantes da Academia, pressionando para que houvesse mais mulheres e negros, o que se refletiu (ainda que de forma muito tímida) nas indicações em anos posteriores.
Em comunicado oficial a HFPA prometeu mudanças até agosto deste ano, desde quadros de executivos até o quadro de votantes.
“I May Destroy You”, de Michaela Coel, foi responsável, mesmo que indiretamente, a colocar uma pá de cal em uma premiação que já vinha perdendo prestígio ano após ano. Enquanto isso, a série e sua criadora ganham a chance de mostrar mais de seu talento em uma possível segunda temporada para rede de TV inglesa BBC.
Você pode assistir às duas séries aclamadas de Coel nas plataformas de streaming. ‘I May Destroy’ está na HBO e ‘Chewing Gum’ pode ser conferida na Netflix.