Teto de vidro racial: até onde a mulher negra pode crescer dentro de uma organização?

O impacto do racismo, especialmente na progressão profissional das mulheres negras, que enfrentam múltiplas barreiras estruturais no Brasil, perpassa o desafio de conquistar uma posição de liderança. Embora a ascensão de lideranças negras, particularmente mulheres, a posições de destaque nos últimos anos seja um sinal positivo de mudança, o racismo sistêmico ainda cria barreiras significativas que limitam seu crescimento profissional. Este fenômeno, pode ser referido como o “teto de vidro racial”, uma metáfora que descreve como o racismo impõe limitações invisíveis, mas profundamente enraizadas, ao avanço profissional.

Mulheres negras frequentemente enfrentam uma interseção de discriminações baseadas em raça e gênero, o que complica ainda mais sua trajetória profissional. Essas barreiras não são apenas um obstáculo para a entrada em campos de trabalho bem remunerados e de alto status, mas também limitam as oportunidades de avanço uma vez dentro dessas carreiras. O racismo institucional se manifesta de várias maneiras, das clássicas atitudes que incluem preconceitos de contratação e disparidades salariais, até às micro agressões cotidianas, silenciamento e desvalorização de competências para aquelas poucas que alcançam a tão desejada posição de liderança.

Apesar da falta de representação, algumas mulheres negras têm quebrado barreiras significativas no Brasil. No entanto, os números gerais ainda refletem disparidades significativas. Segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), mulheres negras compõem uma parcela substancial da força de trabalho brasileira, mas estão majoritariamente em posições de menor remuneração e menor status. Em cargos executivos e posições de liderança, a presença de mulheres negras é ainda mais escassa.

Um relatório de 2020 da Ethos, organização focada na promoção da diversidade nas empresas brasileiras, mostra que apenas uma pequena fração dos cargos de liderança é ocupada por mulheres negras. Em grandes empresas, a porcentagem de mulheres negras em posições de liderança é mínima, refletindo não apenas o racismo e sexismo institucional, mas também a falta de políticas eficazes para promover a diversidade e inclusão no ambiente corporativo.

Mas o que tem depois do “teto de vidro”? O que a branquitude teme ao dar acesso e oportunidades para uma parcela da sociedade (56%) tão fundamental para a sustentabilidade corporativa e social? Segundo a psicóloga, ativista e escritora, Cida Bento, no Livro Pacto da Branquitude, “Há um lugar da branquitude que é colocar todos que não são brancos em uma condição de inferioridade. Isso é um pacto. O branco tem muito medo de ser minoria e em alguma parte dele sabe que aquilo que ele tem como privilégio foi expropriado dos negros. Durante quase 400 anos de escravidão, entre pouco mais de 500 anos de Brasil, quem trabalhou no país foram os negros. Esse lugar do branco aciona o medo. Os negros são credores que incomodam”.

Para superar o “teto de vidro racial”, é crucial a implementação de políticas de igualdade racial e de gênero que não apenas abordem a contratação e promoção, mas também criem um ambiente de trabalho inclusivo e de suporte. Existem dezenas de listas de boas práticas corporativas facilmente encontradas nos sites de busca, e nenhuma delas fará sentido sem a intencionalidade e o compromisso de quem toma as decisões. Para que uma organização se torne verdadeiramente inclusiva, o primeiro passo é a intencionalidade. Lideranças comprometidas com os valores sociais e a intenção de uma política interna sustentável. O Pacto Global tem um programa de direcionamento chamado Liderança com ImPacto, voltado para líderes comprometidos com os valores sociais, consequentemente raciais, a partir dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS). E para focar nas questões raciais, tem o Pacto de Promoção da Equidade Racial, uma iniciativa que propõe implementar um Protocolo ESG Racial para o Brasil, trazendo a questão racial para o centro do debate econômico brasileiro e atraindo a atenção de grandes empresas nacionais e multinacionais da sociedade civil para o tema. Ferramentas de transformação não faltam.

O caminho para desmantelar o “teto de vidro racial” que limita as mulheres negras no Brasil é desafiador, mas não intransponível. Às empresas: aumentar a representação de mulheres negras em posições de liderança não é apenas uma questão de justiça social; é também uma estratégia que enriquece o ambiente de trabalho, trazendo diversas perspectivas e experiências que podem impulsionar a inovação e o sucesso organizacional. Às mulheres negras: não aceitem trabalhar apenas nos bastidores. Busquem a luz, a visibilidade e o reconhecimento que lhes pertencem. Não se diminuam para caber em lugares que não a valorizem.

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