‘Fortalecem a autoestima e geram oportunidades concretas’, Juliana Lourenço explica como redes de apoio fortalecem salões de cabelo natural no Brasil

Manter um salão especializado em cabelos crespos e cacheados no Brasil envolve desafios que vão desde a falta de profissionais qualificados até os altos custos de capacitação e insumos. Em entrevista, proprietárias de estabelecimentos em Campina Grande (PB) e no Rio de Janeiro relataram as dificuldades que enfrentam no setor e as estratégias que desenvolvem para se manter no mercado.

Para Silmara da Silva Campos, proprietária do Odara Studio, em Campina Grande (PB), a concentração de cursos de especialização no Sudeste do país e os altos custos dificultam que ela e profissionais de outras regiões possam se capacitar constantemente: “As capacitações na área da beleza, em geral, são caras, principalmente se forem cursos presenciais. E, principalmente, são centralizadas no Sudeste, basicamente em São Paulo”, relata. Ela conta que, em Campina Grande, existem apenas 5 salões especializados em cabelo natural, o que aumenta a dificuldade de encontrar mão de obra qualificada.

Já Erica Bello, proprietária de um studio com o mesmo nome na capital carioca, destaca: “Ainda existe uma grande carência de profissionais para o nosso segmento. Os salões tradicionais até ‘oferecem’ alguns serviços para cabelos afro, mas não entregam o que nosso povo necessita. É preciso viver o dia a dia de uma pessoa preta para entender nossas necessidades capilares e oferecer um protocolo assertivo. Eu sou educadora de cabelos afro e formo e qualifico a minha equipe”, explica.

Para a mentora Juliana Lourenço, conhecida como Ju da Conta Delas, as redes de apoio fazem a diferença: “Essas redes criam um ambiente de acolhimento, trocas e crescimento coletivo. Ajudam a romper o isolamento, fortalecem a autoestima e geram oportunidades concretas, como eventos, parcerias e acesso à informação. Quando uma cresce, puxa outra junto. É sobre colaboração, não competição”, afirma.

Juliana explica que, assim como em outros segmentos, o racismo afeta o acesso de empreendedoras negras do setor de beleza a investimentos que poderiam impulsionar seus negócios: “As empreendedoras negras enfrentam racismo estrutural, que impacta diretamente o acesso a crédito, visibilidade e valorização do seu trabalho. Mesmo sendo referência no cuidado com cabelos naturais, muitas vezes essas profissionais não recebem o mesmo reconhecimento ou investimento que salões tradicionais. Além disso, o mercado ainda carrega estigmas sobre o que é considerado ‘profissional’ ou ‘bonito’, o que afeta diretamente o faturamento e a autoestima dessas empreendedoras”.

Para ela, políticas públicas e programas de apoio — como “microcrédito com juros baixos, específicos para empreendedoras negras” — são essenciais para o desenvolvimento dessas empresárias no mercado. “Também é importante oferecer capacitação focada na realidade desses salões, com conteúdos sobre gestão, marketing e finanças, e garantir que políticas de compras públicas incluam salões e serviços de estética liderados por mulheres negras”, reforça Juliana.

Aposta no acolhimento e personalização do atendimento ajuda a fidelizar clientes

Para Erica e Silmara, a concorrência em salões especializados em cabelos crespos e cacheados ainda é baixa, mas o atendimento personalizado é um diferencial fundamental para manter clientes fiéis.

“Procuro oferecer às minhas clientes uma consultoria de cuidados home care. Percebi a frustração de novas clientes ao chegarem ao studio e relatarem que, no salão da colega, saíam com o cabelo finalizado, mas não sabiam como mantê-lo em casa. Uma avaliação precisa conduz a um resultado assertivo. Após o atendimento, entrego um ‘receituário’ com a conduta diária — assim como um médico faria após um protocolo de saúde —, além de um canal para tirar dúvidas (sem custo adicional). Assim, elas sentem que têm alguém que realmente se preocupa com suas dores”, detalha Erica.

Silmara ressalta que muitas clientes chegam ao seu salão após enfrentarem desafios para manter os cabelos crespos ou cacheados naturais: “Meu objetivo é fazer com que o atendimento não seja apenas um serviço de embelezamento, mas também um momento em que a cliente saia se sentindo linda, poderosa e incrível com seu cabelo natural — aquele com o qual ela nasceu. É fazê-la entender que esse cabelo não tem defeito algum”.

“Deixe de ser uma cabeleireira e vire uma empresária!”

A realidade para quem pensa em empreender pode parecer assustadora, mas existem caminhos, como destaca Juliana Lourenço: “Conecte-se com sua história e com a potência do que você representa. Não é ‘só’ um salão — é um espaço de cuidado, identidade e empoderamento. Para crescer, o salão precisa de você em um papel estratégico. Estude gestão, finanças e marketing, e posicione-se como referência da sua marca. Busque conexões poderosas, participe de redes e eventos para empreendedoras negras. Networking é essencial: você precisa estar onde as oportunidades estão. Deixe de ser uma cabeleireira e vire uma empresária!”

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