Anielle Franco, ministra do Ministério da Igualdade Racial, está sendo duramente criticada nas redes sociais por ter viajado em um avião da FAB para participar do lançamento da campanha intitulada ‘Com Racismo Não Tem Jogo’, evento com a CBF na cidade de São Paulo, na final da Copa do Brasil. Embora a participação indique o fechamento de uma articulação em torno do combate e denúncias de racismo em ambiente esportivo e o descolamento da Ministra esteja de acordo com o Decreto 10.267/2021, acabou sendo obrigada a demitir uma assessora que fez declarações inadequadas sobre torcedores são-paulinos no final da Copa Brasil.
Esse episódio nos leva a refletir sobre a ascensão de homens e mulheres negros em cargos de ministros e assessores na esfera do Governo Federal como um processo de democratização. Desde a primeira eleição do presidente Lula, a presença de pessoas negras cresceu sensivelmente em postos do primeiro e do segundo escalão em comparação aos governos que o antecederam.
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Brasília, nas gestões anteriormente conduzidas pelo presidente Lula, nunca viu tantas pessoas negras em cargos de confiança. A inserção nesses postos de poder é resultado e reflete anos de intensa militância do movimento negro no interior do Partido dos Trabalhadores. Direito e uma conquista que deve sempre ser ressaltada e enaltecida, que inclusive refletiu para a aprovação de leis de cotas nas universidades e, posteriormente, no serviço público, o que amplia o número de servidores públicos negros e a possibilidade de inserção em posições de destaque em cargos de direção.
Contudo, outro lado dessa presença, é o acachapante racismo e os racistas fazem parte da máquina do Estado. É fantasiosa a ideia de pensar que essas pessoas cederiam os espaços sem criar fatos cotidianos e tentar forçar a ideia de “não lugar” como afirmou certa vez Joel Rufino dos Santos, tornando a vida de pessoas negras nesses espaços ainda mais difícil. E a Administração Pública Federal tem caminhos secretos e ardilosos, que foram cuidadosamente formulados durante muito tempo. Nem tudo que a lei permite é possível ser realizado. Muitas pessoas acreditam na boa fé, na imparcialidade e neutralidade dos servidores públicos. Qualquer ato administrativo é passível de uma sutil e vital negociação.
É preciso se ater a esses passos que devem ser pensados e articulados, o desconhecimento sobre como funciona a administração pública pode ser vital na manutenção do cargo. E tecer essa teia, principalmente para recém-chegados ao poder é imprescindível para não cair de forma mortal e, por vezes serem penalizados. Cometer um erro ao ocupar um cargo de confiança na administração pública pode impactar de forma trágica a sua vida profissional e até pessoal.
A necessidade dos gestores de atender ao conjunto de agendas os coloca em meio ao campo minado que são as diárias e passagens aéreas. Apesar de se tratarem de viagens a trabalho, a legislação está bem mais rigorosa quanto aos deslocamentos que são concedidos aos servidores públicos. Não se pode ignorar que muitos militantes, passam a estar investidos em funções públicas, na ansiedade de atender aos inúmeros pedidos e de reforçar a aproximação com a base política: por vezes, são traídos e pagam um preço de serem acusados de serem desonestos, e de malversação de recursos públicos. Os canais de comunicação, especificamente as redes sociais, são implacáveis e não perdoam qualquer erro cometido por um servidor público. E, se for uma mulher negra, a resposta é cruel.
Anielle Franco não foi a primeira pessoa negra a viver o escrutínio dos seus atos administrativos e políticos, todos os dias. A história de outros ministros negros nunca foi fácil. Foram sempre contestados e tiveram desfechos dramáticos, terríveis e irreversíveis em praticamente todos os casos. Cada pessoa negra que ocupa um cargo na Administração Pública Federal, desde o momento que chega a Brasília, precisa ficar no mínimo atento. Os inimigos não dormem e estão sempre atentos para criar fatos.
O Ministério da Igualdade Racial nunca foi plenamente aceito na Esplanada dos Ministérios e nos governos estaduais, pois a sua simples existência questiona o racismo estrutural do Estado brasileiro.